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Castigo

Foto do escritor: Nuno PicadoNuno Picado

Atualizado: há 1 dia

Este é um texto que me custa particularmente escrever porque ao longo da minha vida sempre tive muita dificuldade em lidar com situações injustas. E estamos a falar sobre injustiças cometidas contra mim ou contra terceiros, simplesmente não consigo processar este sentimento. Fico a remoer a coisa, a pensar no que correu mal, no que poderia ter sido feito de forma diferente para alterar o desfecho. Por muito ridículo que pareça, ainda hoje me lembro de um episódio muito antigo em que num dia de creche ajudei um colega mais novo a levantar-se depois de ter sido abalroado por um rapaz mais velho. O miúdo chorava que nem um bezerro e quando a educadora lhe perguntou o que se tinha passado apontou para mim sem hesitar. Fiquei de castigo enquanto o mentiroso e o outro brincavam felizes. Fui castigado por ter feito uma boa ação e não sei se aquilo me mudou para sempre ou se já tinha este sentido de justiça apurado, mas nunca o esqueci. E o que se passou ontem em campo foi uma injustiça tremenda à equipa do Benfica. Os nossos atletas não mereciam sair daquele jogo com um empate, muito menos com uma derrota nas circunstâncias que todos sabemos. O futebol mostrou o seu lado mais cruel e, infelizmente para os benfiquistas, também porque é um desporto absolutamente fascinante onde tudo pode acontecer. Esta é uma partida que recordaremos durante muito tempo pelos piores motivos, mas este jogo tem uma história que merece ser contada para além do resultado final.


Quando é que tudo começou a correr mal? O que fizemos para que isto acontecesse? Foi culpa nossa, do árbitro ou do destino? Possivelmente será um pouco de cada, mas no meio da absoluta infelicidade que nos une no dia de hoje existem aqui algumas lições importantes que não podemos mais ignorar.


Começando pela equipa que entrou em campo. Bravo! Interpretação quase perfeita das ideias do treinador durante cerca de 70 minutos e os atletas mereciam muito mais do que aquele triste final. Toda a gente focada, solidária, a explorar os defeitos do adversário na absoluta perfeição. O Barcelona é uma equipa que gosta de ter a bola, mas o processo de transição defensiva é complicado e aproveitámos isso ao máximo. Schjelderup brilhante a segurar a bola, pausar e esticar o jogo, Pavlidis numa noite de carreira em que tudo lhe saia bem, Akturkoglu menos expansivo mas extremamente ativo no jogo, Tino em modo polvo. Os outros sectores um pouco mais nervosos e com alguns erros inesperados, mas a equipa estava muito focada na missão e o plano estava a correr bem... até aos 71 minutos.


Lage preparou este jogo na perfeição. Entendeu muito bem o que o Barcelona tinha de melhor e pior, e preparou a equipa para isso. Só que, para mal dos nossos pecados, voltou a falhar no que já é uma imagem de marca sua: as substituições foram piorando a performance coletiva e convidaram o adversário a meter toda a carne no assador. Começou a pairar no ar um certo desconforto por já não conseguirmos sair com qualidade perante um adversário completamente lançado para a frente e com muita gente na área. E o que vou escrever de seguida vai aborrecer muita gente, mas é exatamente o que vejo e sinto: o Benfica não pode ficar refém das expectativas individuais dos jogadores, seja qual for o seu estatuto. Deixem-me ser muito claro, a entrada de Di Maria num jogo destes não fez sentido nenhum. Zero. O argentino só entrou porque Lage tem medo de perder o balneário e respeita em demasia o seu estatuto. O que vi ontem deixou-me profundamente desiludido. Di Maria não fez sequer um esforço por ajudar os colegas a conter a ofensiva adversária, entrou aos 71' e simplesmente demitiu-se de participar na lógica coletiva que imperava e fez o seu jogo. Esperou pela bola, mexia-se um pouco quando ela andava por perto... mas deixou Carreras (que grande, grande jogo do espanhol) sozinho para lidar com Yamal e depois Raphinha. E eu acho isto absolutamente lamentável e revelador que muitos dos problemas coletivos desta equipa nascem aqui.


Eu sei, eu sei. É o Di Maria. Supercraque, inúmeros títulos, grandes golos, o melhor marcador da equipa, etc. Nada disso está em causa e não estou a dizer que o argentino não pode jogar. No entanto, o coletivo não pode ficar refém do seu estatuto e a gestão dos seus minutos tem de ser feita com pinças por se tratar de um jogador com 36 anos. Temos de extrair o melhor que ele tem, que ainda é muito, mas isto não pode ser feito sem qualquer critério por medo da sua reação. O Benfica está acima de qualquer atleta, treinador ou presidente, ou pelo menos devia ser assim. Se Di Maria tiver de ficar no banco durante 90' num jogo em particular, que assim seja. Se tiver de descansar num jogo da Taça, que aconteça. Não podemos é continuar a prejudicar a fluidez do coletivo para acomodar um jogador que, neste momento, tem características que não encaixam na maneira como a equipa quer defender e pressionar. Não faz sentido.


De resto, cometemos erros infantis que não se pode cometer a este nível. O 3-2 é para os apanhados e faltou profundidade e qualidade no banco para termos um desfecho diferente. Manu Silva, o novo reforço encarnado, teria sido importante no jogo de ontem.


De referir ainda o Sr. Danny Makkelie, um nome que temos de recordar como o de Felix Brych. Exibição absolutamente lamentável. Dos 3 penaltis assinalados, possivelmente o que era mais flagrante foi o que ignorou olimpicamente aos 95'. Não só isso, como ainda permitiu que o adversário saísse em contra-ataque quando já passava mais de 1 minuto depois da hora extra indicada para fazer o 4-5 final. Um absurdo completo de um árbitro com histórico de barracadas destas: foi ele que esteve no Inter x Benfica (1-0) onde foi ignorado um penalti claro sobre Neres e foi também o autor daquele famoso lance em que Ronaldo marca um golo claro no Sérvia x Portugal (2x2) que simplesmente não foi concedido. É um péssimo árbitro e, infelizmente, a fava voltou a calhar ao nosso clube. Resta denunciar esta exibição absolutamente lamentável às entidades competentes para que, no mínimo, não tenhamos de ver este árbitro novamente à nossa frente. Se foi por ele que perdemos? Teve muita influência, mas também demos vários tiros nos pés e isso não pode ser ignorado para que a equipa possa continuar a evoluir favoravelmente.


Por fim, creio que a maior lição que temos de levar desta partida é que a vencer por 3-1 ao intervalo e 4-2 aos 70 min não podemos perder o jogo, seja contra quem for. É que já não é a primeira vez que uma situação destas acontece: de um 3-0 frente ao Inter para um 3-3 sofrido; de amassar a Juventus por 4-1 para um 4-3 final que quase acabou como jogo de ontem; de 0-3 na Turquia frente ao Besiktas para um triste 3-3. São já vários os casos em que nos faltou killer instinct e experiência. Chega a uma determinada fase de um jogo em que, se necessário, não se joga mais futebol. Neste particular lembro-me sempre do épico Benfica x FC Porto (3-1) para a Taça de Portugal em que demos a volta à eliminatória com menos um homem em campo desde a primeira parte. A partir do 3-1, que nos dava a passagem, praticamente não se jogou futebol. Foram 10 minutos de quezílias, discussões e fizemos tudo ao nosso alcance para parar o jogo e irritar o adversário. Não é bonito, mas é eficaz em casos de extrema necessidade. E mesmo sabendo que não existe um paralelismo perfeito entre a vida e o espírito ultracompetitivo do desporto profissional, por vezes o melhor é mesmo deixar o puto chorão no chão e deixá-lo levantar-se sozinho. O mundo que se encarregue de corrigir as injustiças mais tarde.




1 comentário

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JNF1904
Jan 22

O ano passado Di Maria defendeu muito em França.

Jogando apenas 20 minutos, ontem não o fez. Ou não quis, ou recebeu essa indicação.

Sintomático, em ambos os cenários.

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